Por que História e Geografia ajudam a criar um ser humano melhor?
As disciplinas podem formar indivíduos mais críticos e aumentar o poder de reflexão dos alunos
POR:Flavia Nogueira
Foto: Getty Images
Formar indivíduos críticos e aumentar o poder de reflexão sobre a própria realidade. De acordo com professores de História e Geografia este são alguns dos benefícios do estudo destas duas disciplinas.
Reunidos na Virada de Autores (que aconteceu entre 31 de outubro e 4 de novembro em Itapeva – MG), professores de História e Geografia reiteraram a importância das duas disciplinas que, muitas vezes e principalmente no Ensino Fundamental 1, acabam ficando em segundo plano e cedendo espaço para Matemática e Língua Portuguesa.
No entanto, História e Geografia são ferramentas para ler o mundo, segundo Sherol Santos, especialista do Time de Autores de História, historiadora e professora do Ensino Fundamental 2 em Canoas, no Rio Grande do Sul.
“Acredito que o conhecimento histórico proporciona ferramentas de leitura de mundo. Acho que as crianças podem, muito cedo, ter chaves para interpretar o mundo ao redor e o conhecimento histórico faz isso. A gente às vezes tem um certo ranço, (do tipo) ‘aprender com o passado para usar no futuro’. Não é que vamos aprender diretamente, não é aquela ideia de não repetir o passado, mas é entender as opções, as possibilidades, os movimentos das populações, o que estava no horizonte de possibilidades no passado e o que está no meu horizonte de possibilidades para eu fazer a minha ação”, afirma.
De acordo com Aline Moura, professora de História para o Ensino Médio em Macapá, no Amapá, as aulas de História e Geografia são os momentos de reflexão para os alunos.
“História, assim como a Geografia, leva os alunos à reflexão, refletir muito sobre seu espaço, entender de que forma ele atua na sociedade, de que forma ele passa a atuar. É extremamente importante pois leva o indivíduo a ser mais crítico, pensar sobre seu espaço, refletir sobre esse espaço".
Para Rodrigo Baglini, professor de Geografia do Ensino Fundamental 2, na rede estadual de São Bernardo do Campo (SP), a disciplina que leciona leva à contestação que pode resultar em justiça social.
A historiadora Sherol Santos/ Foto: Mariana Pekin
“Por si só a Geografia já contesta a realidade que temos no mundo. A Geografia coloca o homem no espaço geográfico, que é produto de relações sociais, de relações econômicas, de relações entre homem e natureza. Nós, enquanto professores de Geografia, sempre valorizamos o item de crítica, o aluno olhar lá e entender que não está lá por uma condição normal, ele está lá porque um espaço geográfico foi construído. E, a partir do momento em que ele se entende enquanto cidadão, ele consegue propiciar uma justiça social, uma possibilidade de inserção na sociedade enquanto homem.”
Outro ponto importante a ser lembrado é que a Geografia faz uma relação entre a sociedade e a natureza e leva ao autoconhecimento, segundo Regina Tunes, mentora do Time de Autores de Geografia e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). E isso é algo comum nas ciências humanas.
“As ciências humanas, no geral, proporcionam à sociedade (a possibilidade de) se conhecer mais, se questionar e pensar como pode projetar um futuro de uma sociedade mais justa, com justiça social, com direito à cidade, com problemas ambientais mais bem resolvidos, em situações em que uma pessoa esteja exercendo de fato sua cidadania.
‘Disciplina cidadã’
Para outros professores reunidos, História e Geografia podem despertar a cidadania e o questionamento nos alunos.
“Eu entendo que a Geografia é uma disciplina cidadã. Nós (professores) temos esta obrigação de fazer com que o aluno se entenda como indivíduo que modifica o espaço e que a ação dele sobre o espaço tem consequências, (fazer o aluno) entender que ele também faz parte deste espaço enquanto sujeito que sofre por conta do sistema de forças que existe”, diz Guilherme Yamaguti, professor de Geografia no Ensino Médio em Jardinópolis (SP).
Para Guilherme, a disciplina leva a uma reflexão que faz parte da formação cidadã, do aluno “se entender como sujeito no mundo”.
“Confio muito no poder da Geografia, na capacidade dela de garantir esta reflexão, este momento de reflexão do indivíduo sobre o espaço, que vai capacitá-lo para tomar decisões. Temos o dever de formar cidadãos críticos. E aí, a tomada de decisão dele na hora de eleição ou em relação a contestar alguma situação, é particular de cada um.”
Daniela De Moraes, professora de História do Ensino Fundamental 2 em Londrina (PR), afirma que, além de formar cidadãos críticos e conscientes, as disciplinas podem funcionar como um antídoto contra o preconceito.
“Estudar História é dar oportunidade ao aluno de perceber o seu mundo de forma crítica, plural, uma forma diversa e aí, a partir deste pensamento de que o mundo é feito de forma plural, eu consigo entender que o diferente não precisa ser o meu inimigo, mas pode ser uma oportunidade para que eu possa abrir os olhos e entender que o outro me abre portas para aprender mais. Por isso que o ensino de História é tão importante, porque no mundo nós não vivemos apenas na nossa bolha”, diz.
Primeiros anos
Esta formação de cidadãos críticos e a reflexão sobre a realidade pode começar já nos primeiros anos, como destaca Alessandra Bremm, professora de História nos primeiros anos da rede estadual de Lagoa Vermelha (RS).
“(A História) É esta reflexão sobre a realidade, sobre o cotidiano. História está em tudo. E esta consciência pode ser desenvolvida desde muito cedo. E a reação deles (alunos dos primeiros anos do Ensino Fundamental) é uma descoberta, é um espaço que você proporciona para a criança descobrir coisas que, de repente, ela não tinha percebido ainda. Através da História você consegue trazer isso para a sala de aula.”
Apesar destes benefícios, Sherol Santos, especialista do Time de Autores de História, afirma que muitos questionam o estudo de História e Geografia nos primeiros anos.
“Todo mundo diz: ‘ah, mas tem que estudar História mesmo lá no Ensino Fundamental 1?’ Tem. (Tem que) se colocar no mundo, perceber o outro, entender que o outro, mesmo convivendo no mesmo espaço que você, ele tem outra vivência, outra experiência, outra visão. E que estas visões se complementam em um projeto maior. É isso que a História pode contribuir.”
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